domingo, 5 de abril de 2015

METAMORFOSES



Não há coisa alguma que persista em todo o Universo. Tudo flui, e tudo só apresenta uma
imagem passageira. O próprio tempo passa com um movimento contínuo, como um rio... O
que foi antes já não é, o que não tinha sido é, e todo instante é uma coisa nova. Vês a noite,
próxima do fim, caminhar para o dia, e à claridade do dia suceder a escuridão da noite...
Não vês as estações do ano se sucederem, imitando as idades de nossa vida? Com efeito, a
primavera, quando surge, é semelhante à criança nova... A planta nova, pouco vigorosa,
rebenta em brotos e enche de esperança o agricultor. Tudo floresce. O fértil campo
resplandece com o colorido das flores, mas ainda falta vigor às folhas. Entra, então, a quadra mais forte e vigorosa, o verão: é a robusta mocidade, fecunda e ardente.

 Chega, por sua vez, o outono: passou o fervor da mocidade, é a quadra da maturidade, o meio-termo entre o jovem e o velho; as têmporas embranquecem. Vem, depois, o tristonho inverno: é o velho trôpego, cujos cabelos ou caíram como as folhas das árvores, ou, os que restaram,
estão brancos como a neve dos caminhos. Também nossos corpos mudam sempre e sem
descanso... E também a Natureza não descansa e, renovadora, encontra outras formas nas
formas das coisas. Nada morre no vasto mundo, mas tudo assume aspectos novos e
variados... Todos os seres têm sua origem noutros seres. 

Existe uma ave a que os fenícios dão o nome de fênix. Não se alimenta de grãos ou ervas, mas das lágrimas do incenso e do
suco da amônia. Quando completa cinco séculos de vida, constrói um ninho no alto de uma
grande palmeira, feito de folhas de canela, do aromático nardo e da mirra avermelhada. Ali
se acomoda e termina a vida entre perfumes. De suas cinzas, renasce uma pequena fênix,
que viverá outros cinco séculos... Assim também é a Natureza e tudo o que nela existe e
persiste.

Ovídio, Metamorfoses.

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