sábado, 2 de maio de 2015

BIBLIOCAUSTO






Que a minha mão não trema/ ao deitar no fogo forte e primitivo/ todos os traidores/ que me deram veneno.
Queimarei o frio/ geometrizador da vida/ lapidada através de lentes bem polidas/
(ah, o horror daquela pedra voando/ tangida pela mão de não sei que demônio/ e a pensar, pelo espaço, que ainda tem arbítrio!...)...
Queimarei o detrator/ maníaco e vaidoso/ que quis deter a vida numa câmara escura/
(ah, o inferno galopando às doidas/ nos cavalos sem freios/ da vontade cega e sem destino!...)
Queimarei o louco/ ébrio de orgulho/ raivoso de fraqueza/ que destilava haxixe em frascos verdes/ na paisagem alpina
(ah, o prazer com que ainda o queimaria/ em cada uma das voltas pavorosas/ do seu Eterno
Retorno!...)...
E só ficará comigo/o riso rubro das chamas, alumiando o preto/ das estantes vazias.
Porque eu só preciso de pés livres/de mãos dadas/ e de olhos bem abertos...

GUIMARÃES ROSA